Entrevista com Victor Parra, refugiado venezuelano no Brasil
Sorrindo até mesmo nos assuntos mais difíceis, Victor Parra, 19 anos, falou abertamente sobre sua vida em Catia, um barrio (assentamento urbano informal) no oeste de Caracas, Venezuela, onde vivem mais de 1,5 milhão de pessoas. Falar abertamente sobre seu passado é uma coisa. Deixar que isso o defina é outra.
"O lugar de onde você vem não determina para onde você está indo", disse Victor. "Como em tudo, o que importa é sua motivação."
A crise econômica na Venezuela começou em 2010, com a crise de saúde dois anos depois, e a situação atingiu o clímax em janeiro de 2017 com protestos e uma crise constitucional. Mas, ao refletir sobre o período que mudaria drasticamente a vida dele e de sua família para sempre, Victor o chama de "o início da aventura".
"Eu a chamo de aventura porque ela me trouxe até onde estou hoje", disse Victor. "Em 2017, tive a oportunidade de participar de um concurso de oratória patrocinado pela embaixada dos Estados Unidos." Mas quando Victor contou a seus amigos sobre isso, todos disseram que essas oportunidades eram para os ricos, não para pessoas como ele, de Catia.
Mesmo assim, Victor acreditava que poderia escrever uma redação forte o suficiente para participar do concurso. Isso foi antes de ele saber que o tema da redação era sobre um de seus heróis: Martin Luther King, Jr. Para a surpresa de todos, Victor foi selecionado como um dos cinco finalistas. Enquanto seu sorriso crescia de ponta a ponta, Victor descreveu o momento em que sua família finalmente percebeu que, mesmo vindo de um bairro pobre, essas experiências únicas ainda são possíveis.
"Imagine o choque quando minha família deixou de contar bolívares para comprar pão, um fichário novo para a escola, um par de tênis", disse Victor, "e, de repente, sou um finalista e estamos todos a caminho para me ver competir nessa incrível competição".
O concurso foi realizado em uma famosa universidade particular da Venezuela, e os outros quatro participantes eram todos estudantes de "alta classe" que estudavam nas melhores escolas particulares do país.
"Quando eu dizia que era de Catia, era possível ver os olhos deles se arregalarem", disse Victor. "As pessoas não entendem que quem vem de uma classe socioeconômica baixa também pode realizar essas coisas incríveis. Nem todos nós somos ladrões ou pessoas que querem fazer coisas ruins."
Ele acabou ficando em segundo lugar e ganhando uma bolsa de estudos, mas isso foi apenas o começo para Victor, que embarcou em jornadas educacionais únicas dali em diante, conseguindo até mesmo uma bolsa de estudos integral para morar na Alemanha por um ano inteiro para aprender o idioma.
"Depois que terminei a escola, senti que estava caindo em uma rotina e queria sair dela, e foi quando encontrei a LALA em dezembro", disse Victor. "Eu me inscrevi no Acampamento de Liderança do Brasil e fiquei muito, muito feliz quando a LALA me admitiu!"
No acampamento da LALA, Victor sentiu que pertencia a ela. Seu histórico foi adicionado à sua história; não era algo a ser justificado. Ele se sentiu especialmente motivado depois de visitar a Favela da Paz , em São Paulo, e saber como os membros da comunidade estavam realizando mudanças. Foi então que o futuro de Victor ficou mais claro do que nunca, pois ele sentiu a necessidade de voltar para casa e tentar fazer o mesmo pelo seu bairro. " Senti que a LALA era uma luz que iluminava meu caminho", lembra Victor.
"Conhecer todos esses jovens tão apaixonados pelo impacto social e por se tornarem líderes em seus países foi incrível, foi incrível", disse Victor. "Foi como uma recarga emocional de que eu precisava muito e me ajudou a ter uma visão mais clara do que eu queria fazer no futuro."
Mas enquanto estudava em uma universidade pública em seu país, a escola teve que fechar por falta de fundos. Por fim, devido a circunstâncias familiares difíceis, à necessidade de deixar a Venezuela quando a situação piorou e ao fato de o Brasil ser mais acolhedor para os venezuelanos, Victor se mudou para São Paulo.
Victor é agora um refugiado no Brasil. Ele pretende estudar relações internacionais e continuar fazendo trabalho social para garantir que tenha um impacto positivo e direto sobre as pessoas e suas comunidades. " Quando cheguei, me senti chamado a ajudar meus irmãos e irmãs venezuelanos a encontrar melhores oportunidades no Brasil", lembra ele. Duas semanas depois de sua chegada, Victor encontrou o Refúgio 343 e começou a se voluntariar com eles para ajudar outros refugiados a conhecer o Brasil e sua cultura e aprender a encontrar recursos e oportunidades. " Mas o mais importante é motivá-los, convencê-los a continuar e a não desistir, para que saibam que têm pessoas com quem podem contar e para que não se sintam tão solitários", explica Victor, "embora, para ser sincero, acho que meu maior impacto é na minha família. Encontrei um emprego e agora estou pagando os estudos dos meus primos, cobrindo despesas médicas e muito mais. Sou muito grato por ter encontrado uma oportunidade de ajudá-los, que estavam precisando tanto."
Tudo isso parece muito difícil de carregar, especialmente para alguém tão jovem. Mas Victor, que se tornou fluente em português em dois meses, tem um raro brilho no olhar. "Não há barreiras. Quando alguém quer algo e se esforça ao máximo, tudo é possível. Assim como eu, se você realmente quer algo, você pode conseguir."